O ex-prefeito de Volta Redonda e ex-deputado federal Paulo Baltazar teve uma trajetória política que poderia facilmente ser classificada como brilhante. Combativo, bom de palanque e com a língua pra lá de afiada, Baltazar é, ainda hoje, considerado um dos políticos mais polêmicos do Sul Fluminense. Antes de Neto – hoje seu arquiinimigo –, foi considerado o prefeito com maior índice de aprovação popular na cidade do aço. Em 1998 foi eleito deputado federal pelo PSB, com 99.633 votos. Em 2002, reelegeu-se. Mas em 2006 tudo foi por água baixo por conta de seu suposto envolvimento com a Máfia das Ambulâncias – que até hoje ele nega, com veemência. Alguns podem até dizer que, de lá para cá, Baltazar comeu o pão que o diabo amassou. Pode ser.
Sem o mandato de deputado federal, Baltazar – que é médico com especialização em Homeopatia – voltou a clinicar no Hospital São João Batista (HSJB), em Volta Redonda, de onde foi demitido durante a administração do então prefeito Gotardo Netto. “Minha saída do HSJB aconteceu por motivações políticas. Eu não fazia parte do grupo político do prefeito e eles se declararam meus inimigos”, revela o hoje pré-candidato a deputado federal pelo PRTB.
“O que eles quiseram fazer foi tirar meu emprego e me inviabilizar pessoalmente. Infelizmente, tem gente que faz política com ódio. Isso é tentar tirar o alimento de uma pessoa, tirar o sustento – há quem faça isso e diga que dorme com a consciência tranquila”, confidencia. Mas, ao contrário do que possa parecer, Baltazar não guarda mágoas. Pelo contrário. Acredita que tudo o que passou serviu para fortalecê-lo. “Só tenho a agradecer a Deus. Depois daquilo, tive oportunidades maiores e melhores. Hoje posso sustentar minha família”, completa.
As confidências de Baltazar foram feitas ao aQui na quarta, 2, quando a equipe de reportagem o acompanhou durante todo o dia. E por falar em dia, o de Baltazar começa cedo; antes das cinco e meia da manhã ele já está de pé, pronto para o serviço. Quando foi demitido do HSJB, Baltazar – que também é professor de Matemática – foi convidado para trabalhar no Hospital São Lucas, em Quatis, e no Hospital de Emergência, em Resende. “Gosto muito de ser médico. É uma profissão que me realiza”, conta, acrescentando que o fato de trabalhar em outras cidades lhe possibilita conhecer um pouco mais os problemas que afligem os demais municípios. “Os problemas de Volta Redonda eu conheço profundamente. Agora, estou tendo a oportunidade de ver as dificuldades que a população enfrenta em outros locais”, completa.
Num bate-papo informal, a caminho de Quatis, Baltazar fala um pouco de sua vida. Diz que, como tem um dia-a-dia bastante agitado, aproveita o tempo que passa dirigindo para pensar na vida. “Dirigir, pra mim, é uma terapia. Às vezes não tenho tempo pra mim, então, aproveito esse momento para pensar na vida, refletir, ouvir música”, afirma, revelando, dentre outras, que não pretende deixar a Medicina de lado para fazer campanha política. “Aprendi que a parte da manhã é o pior momento para se fazer campanha. O melhor horário para falar com o eleitor é à tarde e à noite. Como preciso do salário para sobreviver, trabalharei de manhã no hospital e no PSF (Programa de Saúde da Família) e, no tempo livre, pedirei votos”, informa, para alegria de seus pacientes.
Baltazar chegou ao Hospital São Lucas, no centro de Quatis, às sete horas da manhã. Ao descer do carro, cumprimenta sorridente a todos que encontra. Ao passar por um grupo de senhoras, na porta da unidade de saúde, provoca um pequeno frisson. “Bom dia!”, diz ele, todo simpático. “Êêêita, Baltazaaaar!”, suspira uma senhorinha, dando ‘aquela’ olhadela, cheia de malícia. Depois de cumprimentar os funcionários da recepção, Baltazar entra no ambulatório. Liga o microfone e, como faz todos os dias, diz: “Bom dia! Graça e paz a todos e a todas”. Do lado de fora, uma paciente de Baltazar, Maria Nadir da Conceição, 59, demonstra preocupação. “Será que ele vai parar de atender por causa da eleição? O pessoal daqui gosta muito dele. É um médico muito bom, trata a gente tão bem...”, elogia.
Enquanto Baltazar atende aos pacientes, uma menininha de uns seis anos de idade, com uma tosse persistente, corre pra lá e pra cá. A tosse incomoda o médico. “Não aguento ver criança tossindo. Cadê a criança que está tossindo?”, pergunta, enquanto dirige-se à porta do hospital. “Vem cá, nenê!”, chama. Baltazar pega a menina pela mão e, chamando a mãe da criança, faz o atendimento – que, aliás, não estava sequer agendado. “Ele é assim mesmo – atende a quem pede atendimento, ou se oferece para atender, mesmo que não esteja agendado. Se não mantivermos o controle, ele não sai daqui. Todo mundo quer ser atendido pelo doutor Baltazar”, revela Marcy Resende Alves, uma das recepcionistas do Hospital São Lucas.
No PSF, antes de fazer as visitas domiciliares De acordo com Marcy, Baltazar é um dos médicos mais requisitados do hospital. “Todo mundo quer tratar com ele, principalmente por causa da homeopatia. Ele é muito simpático, nunca diz não ao paciente – acaba atendendo”, conta a recepcionista, certa de que, se Baltazar eleger-se deputado, fará falta ao hospital. “Claro que, quando a campanha começar, vão surgir perguntas dos pacientes sobre onde ele vai atender. Se ele parar de atender aqui, será uma grande perda. É um médico bem popular”, explica.
A outra recepcionista do São Lucas, Márcia Gonçalves da Silva, concorda com a colega. “É ótimo trabalhar com ele. Baltazar é muito divertido, sempre disposto a ajudar todo mundo. Atende até quem não está marcado e, mesmo quando está atrasado para outro compromisso, sempre para pra ouvir as pessoas”, diz Márcia, que completa: “Só temos elogios para ele”.
Pouco antes de fechar o expediente no Hospital São Lucas, Baltazar sai do ambulatório para tomar um cafezinho e trocar dois dedos de prosa com os colegas. Antes de ir embora, ainda atende a dois pacientes que não estavam agendados e, depois, convida a reportagem do aQui para conhecer as instalações do hospital. “Como você pode ver, a estrutura aqui é bem simples”, diz ele, que, no trajeto, brinca de forma descontraída com os funcionários: “Tudo bem, minha filha? Trouxe a jornalista pra conhecer o trabalho de vocês, viu?”. Em certo momento, com ar de preocupação, Baltazar confidencia: “É uma estrutura bem simples essa, que temos para atender. O São Lucas é um hospital filantrópico que necessita de ajuda”, afirma.
Médico de família
A caminho do PSF I, no bairro Nossa Senhora do Rosário, Baltazar confessa que, como médico, é praticamente impossível não se comover com os problemas dos pacientes. “São os dramas humanos. A gente tenta ajudar da maneira que pode”, observa. Antes que desse continuidade ao assunto, Baltazar para o carro para falar com uma moradora, já idosa. “Tá indo lá pra cima, querida? Quer carona?”, oferece. A senhorinha, carregada de sacolas, aceita de bom grado o convite. No trajeto, quem está na rua acena para Baltazar, que responde dando buzinadas. Às 10h15min, o médico entra no PSF para dar início às visitas domiciliares. Brincalhão, cumprimenta pacientes e funcionários. “Sempre tem alguma coisa pra resolver aqui antes de sair para as visitas. Espera só um minutinho”, pede.
Baltazar é informado por uma das agentes de saúde que só há uma visita a fazer. É na casa de D. Maria, 72, que sofre sequelas de um acidente vascular cerebral (AVC) e, somado a isso, depressão e hipertensão. Acamada, mal conseguindo falar, ela é examinada pelo médico sob os olhos atentos da filha, D. Berenice. “Não pode deixar de dar o remédio de pressão. A pressão dela está muito alta. Vou pedir a alguém que venha aferir a pressão agora à tarde. Tem que ficar de olho”, recomenda. Às 11h38min, Baltazar volta ao PSF para assinar alguns papeis e, logo depois, já está na estrada novamente, rumo a Volta Redonda, onde almoçará com a esposa.
Marido, pai e vovô coruja
O apartamento onde Baltazar mora com a família, na Vila Santa Cecília, é relativamente simples. A decoração é discreta, sem luxo, mas de bom gosto. Na sala, ao telefone, está a responsável por cuidar do dia-a-dia do médico, a esposa Marie Baltazar. Casada há mais de vinte anos, é Marie quem cuida da agenda do marido. Atualmente, ela organiza os pedidos de palestras sobre depressão. “Essa palestra o Baltazar promove nas igrejas. Faz uma explanação da doença sob o ponto de vista clínico e, depois, sob o ponto de vista espiritual, baseando-se em casos de depressão relatados na Bíblia”, explica a ex-vereadora, acrescentando que, como os pedidos de palestras são muitos, a agenda de Baltazar está lotada até agosto.
Evangélico, o casal frequenta a Igreja Metodista do Retiro. “Essas palestras são independentes da política. Começaram quando ele dirigiu a escola dominical em nossa igreja”, conta Marie, acrescentando que o assunto despertou o interesse das pessoas – daí os pedidos de palestras em outras igrejas. “Este é um trabalho social que ele faz, como médico e como cristão. O ministério do Baltazar, dentro da igreja, é o ensino”, acredita. Almoço na mesa: arroz, feijão, salada e carne assada. Baltazar toma guaranita. “Daqui a pouco vou levar minha netinha à escola”, avisa o vovô coruja, referindo-se à pequena Lara, de 3 anos, que corre toda serelepe pela casa. Antes disso, porém, o médico assiste com o filho, Felipe, a um pedaço do jogo do Brasil.
Marie, já arrumada, se despede do marido. Vai à Vila Brasília, onde Baltazar, todas às quartas-feiras, atende à população gratuitamente. “Vou indo, amor, pra adiantar as fichas. Daqui a pouco a gente se encontra lá”, diz Marie. Nisso, Lara já está pronta para ir à escola. “Vamos, vovô!”, diz a pequena, pegando Baltazar pela mão e despedindo-se da mãe, Larissa, que a partir de dezembro será médica como o pai. Lara gosta de ir à escolinha a pé. De mãos dadas com o avô, tagarela que só, fala sobre tudo o que vê. “Ela é a paixão da minha vida”, confidencia o médico, todo derretido.
Trabalho voluntário
Enquanto dirige-se à Vila Brasília, Baltazar explica que desde que se formou em Medicina separa um dia da semana para atender às comunidades carentes. “Comecei no Açude, onde não tinha nem posto de saúde. Também atendi no Padre Josimo, quando o bairro começava a surgir, a pedido da comunidade. Lá no Vila Rica – Três Poços também, quando não havia nem água nem esgoto”, relembra, acrescentando que também atendeu em bairros como Belo Horizonte e Belmonte.
Na Vila Brasília, segundo Baltazar, o atendimento médico voluntário é feito há três anos. O consultório – que funciona numa sala cedida por um amigo do casal – fica numa viela. Na porta, uma placa avisa que os atendimentos são às quartas-feiras, a partir das 13h30min. Quando a reportagem chegou ao local, Marie Baltazar já organizava as fichas médicas e conversava com os pacientes. “Aqui temos cerca de 600 pacientes. Vem gente de todos os pontos da cidade, que ouvem que o Baltazar está atendendo aqui. Temos pacientes de bairros como Ponte Alta, Fazendinha, Pau D’alho, Vale Verde, Verde Vale, Mariana Torres, Belo Horizonte, Retiro, Vila Mury e até do bairro Mangueira, em Barra Mansa”, conta Marie.
Em média, Baltazar atende a cerca de 15 pacientes. Uma delas é a dona de casa Marisol Aparecida Miranda, moradora do Retiro. “A família toda vem tratar com o Baltazar. Meu filho de 15 anos tem asma brônquica e sofria muito com isso. Chegou a ser desenganado pelos médicos. Eu trouxe para o Baltazar ver e começamos o tratamento com a homeopatia. Foi de Deus o Baltazar atender de graça aqui. Nunca mais meu filho teve crises”, comemorava a mulher. Com o passar do tempo, mais pacientes chegavam. “Nossa, ficou bom o consultório aqui, né?”, comentava uma senhora. Naquela tarde, Baltazar atendeu – sempre simpático e atencioso – a 13 pacientes. “É que está frio e é véspera de feriado. Teve pouca gente hoje”, avalia.
Os atendimentos terminaram por volta das 16 horas. “Agora vou dar um pulo em casa e descansar um pouco, porque tem palestra hoje à noite”, diz ele para a esposa, Marie. E o médico foi para casa. Às 19 horas ele daria uma palestra sobre depressão na Igreja Batista de Barra Mansa. “Deve terminar por volta de umas 21h30min, 22 horas. Depois, eu vou pra casa descansar e curtir um pouco a minha família”, contou. Dormir? Só depois das 23 horas. Dormir e acordar às cinco da manhã do dia seguinte, para começar tudo de novo. Ele está de volta!
MATÉRIA PUBLICADA NO JORNAL AQUI
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